segunda-feira, 6 de maio de 2013

Rebeldia e Tradicionalismo

Sempre que eu vejo vampiros "modernos" eu me pergunto que diabos fariam os antigos se tivessem como pegá-los no flagra, em seus ataques de histeria e colocá-los em seu devido lugar... Bom, não fiquei só na imaginação, transformei em conto, um dos meus favoritos da primeira leva do Lua Macabra, mas que não sei se encaixa REALMENTE nele... Já consegui alguns bons sorrisos de dentes pontiguados com ele, então... Quem sabe... Eu traga mais alguns caninos para o meu lado hoje... Aproveitem o sangue jovem, mas não esqueçam do poder do sangue antigo!



Abaixo o Antigo, Viva o Novo!

Houve um tempo em que éramos poucos. Tão poucos que não encheríamos um prédio de condomínio, daqueles com só quatro andares, que não se vêem mais por aí. Agora, se eu piscar, verei dois novatos entrando pelas portas de minha casa, implorando ensinamentos antigos, que não são capazes de compreender. Eu bebo raramente agora, minha idade me deu tanta força que não preciso me conter para andar por entre os mortais. Sei que eles me sentem, um frio inconstante que me impede de simular vida, mas o que eu faria, com tantos séculos, se ainda andasse com trajes dos tempos de seus avós? Eu precisava me atualizar. E isso foi o que os atraiu. Como poderiam menosprezar a chance de conhecer alguém tão velho? Heh, velho, é claro.
Não vou mentir. Seu fedor chegou a mim no instante em que o carro virou a esquina. Vinham precavidos, refazendo o caminho que treinaram tantas vezes, para que não fossem percebidos. Falharam, óbvio. Desceram do veículo e ouvi os passos pesados. Ao menos um deles portava armas, o tilintar extremamente audível para qualquer um com minha idade. Se me ameaçassem, tinham a vã esperança de me causar algum dano antes de reagir. Talvez conseguissem, não luto há mais tempo do que eles existem.
A porta abriu, sem parcimônia, e eles entraram, demonstrando o mínimo de respeito possível. Claro, para eles, cujos costumes eram mais bárbaros que o povo mais selvagem de minha época, este era o certo, o "educado". Não queriam me pertubar, para que eu não lhes desse a reprovação sem antes abrirem suas bocas e falarem todas as besteiras que pensaram durante aquele mês. Prometi a mim mesmo que lhes daria a chance. Quem sabe não doeria tanto, quem sabe não seria como ouvir os bardos cantando sobre heroísmos que nunca existiram? Poderiam até ter pesquisado sobre mim, e encontrado algumas daquelas anedotas quase perdidas sobre o tempo.
Eram dois, realmente, e tão díspares, um magrelo e uma mulher. Desconfio que gostassem das mesmas coisas, visto que se trajavam de forma dissonante, ainda que reveladora de suas almas. Os cabelos, ralos, dele, caíam sobre os olhos, raspados ao lado da cabeça, passando do intenso negro para um vermelho berrante. Suas roupas se resumiam a uma folgada camiseta bordô e uma calça colada, que provavelmente era de couro. A maquiagem em seu rosto, banal nos dias de hoje, era tão ou mais pesada que a da fêmea. De forma esguia e sensual, ele tentava transperecer tanta feminilidade quanto ela, em seu vestido canudo, com abertura no ventre para revelar a barriga bem construída e uma nesga da lingerie preta. Os cabelos, curtos em corte Cleópatra, caíam leves logo acima dos intensos olhos azuis. Seus lábios, vermelhos, quase tão convidativos quanto os seios, apertados no topo do vestido tomara-que-caia. Definitivamente, duas jóias raras, que poderiam me atrair e levar ao inferno pessoalmente.
A voz que saiu do garoto não era o que esperava. Tinha um tom grave, com pequenas desafinações, como no fim da adolescência: - Aí está você... Milorde. - A bajulação soou fria, vazia, um gracejo pobre para convencer-me de devoção inexistente. - Procuramos pelo senhor há tempos...
- Não diga, asneiras, Todd. Ele sabe que não é verdade. - a voz dela, no entanto, era bem o esperado, um arfar sensual, como se precisasse conter toda a sua eroticidade em cada palavra.
Decidi me abster de comentários, continuar apreciando o espetáculo. Esquadrinhei seus perfis no escuro, imaginando se poderiam oferecer ao menos uma fração do perigo que desejavam transmitir. Ela era a inteligente, claro. Ele, por outro lado, era o esperto, o sobrevivente e sacrificaria tudo, inclusive ela, para sair dali vivo. Resolvi jogar esse jogo.
- Desculpe minha companheira, mestre. Ardell nunca aprendeu a ser digna diante de um nobre. Mais ainda quando o nobre é tão importante quanto o senhor. - ele já me deixava enfadado e pensei seriamente em cortar seu pescoço naquele momento.
Ela bufou, compartilhando da minha falta de entusiasmo e me peguei pensando em como uma garota tão esbelta poderia ter tanta falta de ar. Não com aqueles pulmões, imagino. Já ele, tentava abertamente me chamar a atenção, dominar minha vontade. Falhou completamente.
- Se o mestre permitir, gostaríamos de um minuto do seu tempo. - me perguntei se ele havia sido transformado por caridade ou brincadeira e que estúpido o fizera.
Finalmente resolvi que seria bom me pronunciar, talvez conseguisse mandá-los embora. Apesar de tudo, não gosto de matar aqueles da minha raça: - Você já está gastando meu tempo, criança. Então seja rápido antes que a conta fique muito cara.
As reações, adversas, foram as melhores até aquele momento. Todd, como chamara a garota, parecia estupidamente ofendido e fazia uma expressão perdida que talvez lhe levasse ao erro fatal. Já ela, pela primeira vez, olhava diretamente para mim, entretida com a forma como eu despachara os dois. O garoto procurou em volta e diversas vezes conteve a mão que se dirigia para as costas, provavelmente à procura da arma. Antes que voltasse a falar, me ergui de minha poltrona e caminhei até eles. A mão enfim fez o percurso, mas não encontrou coisa alguma. Seus olhos não poderiam crêr que eu realmente brincava com a pistola, uma calibre .38 como viria a saber, procurando entender seu funcionamento. A garota, Ardell pelo que ele tinha dito, colocava a mão suave sobre os lábios, contendo o "Oh" de assombro. Joguei a arma por sobre o ombro esquerdo e toquei o rosto do jovem, trazendo-o para perto do meu. Nossa diferença de altura, eu dez centímetros maior que ele, no mínimo, sumiu assim que ele se pôs nas pontas dos pés.

- Não me dê motivos para achá-lo ainda mais irritante. Se nada tem a dizer, aproveite que estou satisfeito com o presente de metal, e suma de minha presença.
Soltei-o e ele caiu de joelhos, chorando. Dei as costas, crente de que eles partiriam, quando fui surpreendido pela garota. Ela utilizou tudo que tinha para conseguir velocidade suficiente para surgir na minha frente. Sorria, nervosamente, e passava um pirulito vermelho por entre os lábios, encarando-me com forte admiração. Naquele momento, incoerentemente, eu que me tornei a presa. Delicadamente me tocou o peito, apertando os dedos sobre a minha carne e arfou profundamente.
- Sabe o que queremos, não sabe? Já sabia assim que entramos em seus domínios. Bom, eu estou disposta a me oferecer em troca de tudo que você puder me passar. - ela provocou, mordiscando o pirulito com vontade.
Ergui a sobrancelha, mantendo a aspereza na voz: - E o que me impediria de tirar de você isso que tem a me dar? Acha que vale tão pouco o que EU tenho?
Ela não respondeu, continuava com a malícia nos lábios e virou-se, caminhando e rebolando, em direção ao caixão antigo que conservava em meu refúgio. Apoiou as mãos nele, erguendo o traseiro e me observando por sobre os ombros.
- Nada impede, porém, nada garanto que será tão bom quanto o que EU tenho para sacrificar. Só quero... Um pouquinho de seu poder. - ela dizia, sua voz ainda mais provocante.
Movimentei-me para suas costas, apertando seu corpo ao meu, revelando quão pequeno era. Comprimi sua cintura entre a minha e o caixão e cravei os dentes em seu pescoço fino e macio. Eu havia lhes dado todas as chances. Se ela queria isso, teria. Rasguei seu vestido sem pensar duas vezes, fazendo com que ela desse um gritinho assustado. A expus completamente, satisfazendo-me com a visão de um corpo perfeito, parte moldado com as facilidades dessa era moderna. Passei a sugar o ralo sangue daquela criatura por tempo suficiente para eu mesmo estar livre de roupas. Ouvi os gemidos dela passarem de dor para prazer e foi o que dei a ela. Sabia que o rapaz ainda não havia fugido e decidi que se o que ele queria era apreciar o que eu fazia com a sua amiguinha, deixaria que o fizesse. Pressionei-a por muito tempo, até me sentir completamente agraciado com seu corpo. Larguei-a, longe do meu caixão, e olhei de um para o outro. Havia bebido o suficiente dela para que estivesse realmente renovado.
- Agora, se nada mais tem a fazer. Por favor, abandonem meu... - uma pontada estranha me fez olhar para meu peito.
Destoando do resto de minha roupa, uma pequena estrela de prata adornava a região próxima ao meu coração. De fato, a garota errara por centímetros. Se ainda não sentira, era por causa do êxtase que ela me causara. Eu agora estava furioso. Os dois não haviam percebido que falharam em seu plano e riam descordenadamente. Com extrema raiva, eu agarrei a garota pelo pescoço, e como estava ainda exausta do meu tratamento, foi fácil jogá-la para dentro de uma porta, um quarto anexo ao meu. O garoto, lentamente entendendo o que acontecia, não escapou de um golpe profundo, que o lançou pela janela. Eu moro no quinto andar de um prédio antigo. É muito alto. Antes que ela se levantasse, eu a pressionei contra o chão de madeira. Ainda não estava pronto para deixá-la morrer. Ainda não. Entre gritos, eu a arrastei para dentro da sala escondida, trancando-a longe de qualquer ajuda, e utilizei a estrela de prata para deixá-la imóvel. Ao que parece, ganhei dois presentes nesta noite.

Venham a mim, crianças da noite! - ordena Drácula, imortalizado por Bela Lugosi.

2 comentários:

  1. "Ao que parece, ganhei dois presentes nesta noite."
    Melhor frase do conto =D

    Sempre me perguntei como eram os nossos anciões na sua juventude.
    Pense naquele vampiro confiante e com plena convicção dos seus poderes na sua juventude, vivendo em um mundo onde todos eram mais fortes do que ele.

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    1. Simplesmente, SIM. Este Ancião representa cada um dos vampiros ancestrais que os séculos fizeram muito bem, obrigado, e que vão tomar o caste... A... ... O loft dos vampiros novinhos que mal sabem virar morcego! XD

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