quarta-feira, 23 de abril de 2014

Como uma folha no vento

Engraçado o título dessa postagem, vem de outro personagem que eu curto muito e de repente fiz uma ligação bizarra entre ele e a imagem que me fez escrever esse conto. Bom, de qualquer forma, isso não importa, quero que vocês mesmos tenham uma impressão nova sobre o texto. Hei, é o primeiro depois de meses! Estou devendo ainda uns textos do desafio (mais precisamente três) que trarei logo pra fechar minha conta. E também retornarei a projetos antigos e verei no que dá.
De resto, agora casado e na minha própria casa (apartamento, na verdade), estarei pronto pra me dedicar um pouco mais, de cada vez, ao blog.
Aproveitem o conto!

Almas Prometidas

Encostou-se na parede, segurando a barriga para não deixar o sangue escorrer mais depressa. Não tinha muito tempo pelo jeito, então o negócio era conversar para se distrair. Ela chorava, chorava de soltar berros de dor.
- Ei... Cala a boca...
- Por que... Por que você fez isso?
- Nem eu sei bem... Acho que foi instinto, algo dentro de mim disse para fazer. Nem pensei muito.
Ali perto, próximo de cair do penhasco, o corpo do assassino finalmente ficou frio, a nesga de vida se esvaindo para o limbo de onde voltaria algum dia. Sua espada escorregou para o vazio, o nada em que ele iria jogá-la. Ainda bem que não conseguiu, mas não sabia por que pensava isso, a conhecera há tão pouco tempo.
- Como é mesmo seu... Ah, esqueça... Não preciso saber...
- Diga, se for te ajudar, diga.
- Seu nome, qual é mesmo?
-Zee. É assim que meus amigos me chamam.
- Zi. Diferente...
- É Zee, com dois e’s. Eu não gosto muito do meu nome, era de uma antiga rainha, só que as histórias sobre ela são cheias de tragédia.
Ele olhou de relance para seu inimigo morto, pensando quão irônica ela podia estar sendo. Seu coração começou a bater mais devagar, muito mais fraco, então logo chegaria sua vez. Ao menos ela estava inteira, poderia fazer sua parte, talvez transformar aquele mundo negro em algo bom, trazer de volta os sorrisos dos aldeões, dos povos da floresta, da montanha e do mar... Por que pensava nisso? Nunca fora tão altruísta.
- Eu realmente queria ter viajado mais, conhecido outras pessoas...
- Você vai, vamos sair daqui, eu vou lhe recompensar e então você poderá ter sua própria fazenda! Talvez comprar outra égua como aquela... Sinto muito, não tive a intenção.
- Tudo bem, era só uma égua velha. Nós tivemos nossos momentos, mas ela não andava bem da cabeça. Sua fixação por cenouras quase me faliu.
- Você é engraçado. Quero te conhecer melhor.
- Garota... Não vai dar... Ele me cortou ao meio com a espada, eu...
- Por favor não! Não quero que meu salvador vá embora assim.
Que menina egoísta, como se ele tivesse ao que se agarrar. Órfão, pobre, apenas algumas heranças como o chapéu idiota que o protegia do frio, a flauta esquisita e a égua que nunca o levava para onde queria. Agora estava tudo perdido, o chapéu caíra no abismo, a flauta fora quebrada e a égua... Pensou nos últimos momentos ao lado dela e seu coração falhou em uma batida ou duas. Não conseguia mais respirar.
- Zee... Vem cá.
Ela se aproximou, agarrando sua mão. Chorava de soluçar, os olhos completamente marejados. Incrível como mesmo assim era a garota mais bonita que já vira.
- Hei ei ei. Tudo bem, estou aqui ainda. Fique do meu lado.
- Vou ficar,pode acreditar!
- Também... Também quero te conhecer melhor... Talvez, algum dia.
- Vocêpromete?
- Eu... Eu prometo, juro!
Ela sorriu, a primeira vez que ele viu aquele sorriso, e foi com essa visão que ele se foi. Sua alma abandonou seu corpo logo antes do resgate chegar. Eles tiraram ela de lá arrastada, aos gritos.
...
O homem entrou no palácio acompanhado do filho que tropeçava nos próprios calcanhares. Era o grande dia, o nascimento da herdeira do trono. Há anos que esperavam por ela, por aquela que carregaria o legado da família real. Seus pais pareciam felizes, a primeira menina em trezentos anos. Todos foram trazidos para festejar.
Debaixo da sacada, metade do reino esperava ansioso pelo aparecimento do rei carregando a bebê nos braços e ovacionaram quando as cortinas se abriram. Ainda com o manto de dormir, o soberano trouxe a menina enrolada nos cobertores arroxeados. O fazendeiro ergueu o garoto nos ombros para que conseguisse olhar para ela.
- Vê, Link? Essa será sua rainha!
E com os olhos vidrados, completamente hipnotizado pela criança que mal conseguia ver, o menino sorriu com tudo, algo vindo de dentro do seu espírito.

- Sim, pai. E eu lutarei por ela. É uma promessa!